quarta-feira, 26 de setembro de 2018

QUEM SABE, LER

A eleição do pavor”. É o que está escrito na capa do jornalismo de quinta categoria da Revista Veja, panfleto ordinário que não leio há quase duas décadas. Para justificar o título, o periódico traz três chamadas. Na primeira, assinala: “O mercado se assusta com a paralisia de Alckmin nas pesquisas”. Na segunda, afirma que os Democratas estariam assustados com a liderança do candidato Homofóbico, defensor do armamento da população e da pena de morte, e que promete resolver tudo no Brasil com frases feitas. Na terceira deprecia o candidato preferido do povo: “Os que acreditam na lei se assustam com a força de Lula mesmo preso”.
Ao me deparar com a tal Capa, lembrei-me de uma matéria assinada pelo jornalista André Zanardo, para o site “Justificando”, cujo título é “A manipulação em 100 capas da REVISTA VEJA”. Na receita da tramoia jornalística, estariam definidos o certo e o errado; o que nela, não sai..., seria problema secundário e o leitor já saberia o que fazer ao terminar de ler uma matéria.
Além disso, todo um processo de construção do inimigo (no caso Dilma/Lula/PT), numa jogatina em que, ao mesmo tempo cultiva esperança e medo (mais medo que esperança, diz Zanardo). Na razão de pano de fundo, um jogo de semiótica (É a teoria geral das representações, que leva em conta os signos sob todas as formas e manifestações que assumem (linguísticas ou não), enfatizando a propriedade de convertibilidade recíproca entre os sistemas significantes que integram), no caso e precariamente conceituado, seria uma conjugação de palavras e imagens que enderece o leitor a uma conclusão imediata e premeditada pela revista.
Raios, trovões, fogo, fumaça alimentariam o imaginário do leitor burro que a segue. A peruca de serpentes na cabeça de Lula, uma de suas capas, ilustra bem esse roteiro.
Na capa dessa semana a revista deixa claro o que todos sabem: Alckmin é o candidato do mercado. O mercado que não é ético nem honesto tem como porta-voz a própria revista. Mas, como diria Sejumoro, isso não vem ao caso. Ao dizer que os democratas se assustam com o crescimento de JB (o candidato fascista que não se deve citar o nome), é como se na democracia desses tais democratas não existisse soberania popular.
Leia-se, a democracia que Veja ajudou a derrubar, que culminou com a cassação do voto popular por meio de um golpe. Contraditoriamente, a preocupação dos democratas de Veja é com o candidato que aglutinou em torno de si o ódio democraticamente disseminado por ela. O mesmo ódio que permeia o mercado e que hoje está preocupado com o congelamento de Alckmin - rejeitado até por dona Marluce das cabras. Veja o vídeo: 
É curioso como tudo gira e volta para o jogo de interesses de Veja, que são os mesmos do mercado e que, portanto, é ela quem está preocupada com o estacionamento do Alckmin. O tucano, aliás, é cumplice do golpe e hoje está aliado ao tal “Centrão”, cujos leões “não passam sem carne”, no dizer do fascista JB. Como a Farsa Jato veio a serviço do golpe (o pretenso moralismo é narrativa de araque), os mecanismos de eleição e governança são os mesmos.
Desse modo, JB vai ter que dar carne para os leões, caso Dona Carminha decida a eleição de 2018 no tapetão, ignorando o voto de Dona Marluce. Portanto, JB que quer armar a população que Veja ensinou a ter medo e nela despertou o interesse por armas, só pode ser a primeira ou segunda alternativa presidencial de Dona Carminha da Veja.
Parênteses! Na Academia Nacional de Polícia, centro de formação de policiais federais, era comum nas aulas de armamento a seguinte frase: “isto é uma arma e foi feito para matar” (às vezes, faziam um disparo para assustar o aprendiz de Macabéa). Lá não disseram, mas aqui eu digo: quem quer se defender/proteger compra capacete, colete à prova de bala, gradeia a casa, blinda o carro e coisa e tal. Quem quer ter arma traz enrustida a intenção de matar:
É um homicida em potencial. Arma é instrumento de ataque e não de defesa. A propósito é bom lembrar que na democracia de Veja existe a tal bancada da bala, da bíblia e do boi (esqueçam aqui as cabras de Dona Marluce) que juntas é tudo mercado. Portanto, o mercado e o ódio juntos formam uma coisa só.
“Os que acreditam na lei se assustam com a força de Lula mesmo preso”. Essa é a terceira chamada, na qual Veja mostra sua frustração com seu fracasso depois de tantas capas atacando Lula: “O desespero da jararaca”, “A vez dele” (Lula), “Os chaves de cadeira que cercam Lula", “Culpado” (Lula), “Eles sabiam” (Lula e Dilma), “Vocação autoritária”, “O que falta para Lula ser preso” e, sem esgotar o rol de insultos, a capa triunfal: “Acabou”. Só faltou um “obrigado, Sejumoro”.
Como assim, cara pálida? Ninguém mais que Lula acredita na lei: ele bate reiteradamente às portas dos tribunais que o ignoram. Os urubus de Dona Carminha Suprema não estão nem aí para a presunção de inocência, que é direito fundamental e que direito fundamental é cláusula pétrea. Até a Interpol já desqualificou a Farsa Jato, pois vê suspeição nos atos da República de Curitiba. Foi Curitiba que arrumou uma “ficha suja de plástico” para Lula. Afinal de contas, quem são os assustados crentes em lei que Veja diz estarem preocupados com a força de Lula, mesmo preso?
A Constituição Federal foi rasgada ao derrubarem a Dilma Rousseff sem crime. As Macabéas do golpe realizaram quase 300 prisões ilegais impunemente. Um magistrado de primeiro grau desobedece uma ordem de desembargador. Um juizeco (não mais oficiante de um processo) se alia a um desembargador (também já sem poder jurisdicional no caso) para desobedecer a uma ordem legal.
A PF Macabéa sucumbe aos embargos telefono-auriculares. O mesmo juizeco foi responsável pela divulgação ilegal de conversas da Presidência da República e nada aconteceu. Trata-se do mesmo barnabé judicial que teria confessado perante o Conselho Nacional de Justiça que agiu fora da lei para “evitar mal maior”...
Fazer tudo isso e ignorar uma ordem/recomendação da Organização das Nações Unidas seriam coisas de quem acredita em lei? A Veja, que é mercado, trata como “defensores da lei” aqueles que as leis violaram para atender o mercado, mercado que vende bala, e que irá propiciar mais crimes. Seria possível desenvolver vários raciocínios mostrando que tudo é uma coisa só.
Entretanto, prefiro dizer que a tal revista está frustrada com os resultados de suas centenas de tons de ódio que disseminou. O ódio que ela inoculou (ou apenas despertou) encontrou em JB, o defensor do armamento da população, seu ponto de apoio. Agora, está perdida porque no fundo no fundo seus editores pareciam dizer: primeiro a gente desperta o medo e o ódio. Depois, se nada der certo (ou der certo), a gente arma a população.
Armando Rodrigues Coelho Neto - advogado e jornalista, delegado aposentado da Polícia Federal e ex-representante da Interpol em São Paulo

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